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A noite era de calor tórrido e abafado. As ventoinhas exibiam as pás difusas, na lentidão do remexer o ar parado. O lobby do hotel, mesmo assim, era um oásis ténue no deserto da noite citadina.
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E vi-te entrar na camioneta da escola que partiu numa nuvem de poeira, como nos romances. E eu, a personagem feminina, deveria chorar a ver-te partir. Em vez disso fui tomar um banho de imersão bem frio. Não durou muito tempo porque as cucarachas também estavam cheias de calor, e apareceram para se refrescarem.
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A minha surpresa ainda foi maior, porque à minha frente estava um homem alto, ligeiramente curvado na minha direcção, como se estivesse a fazer uma pequena vénia. Reparei na altura que vestia um fato preto a contrastar com o forro dum vermelho vivo, camisa branca e gravata azul escuro com riscas laranjas, brancas e azul claro. Fiquei presa naquelas riscas hipnóticas e fui despertada pelo fumo acre da cigarrilha cubana.
. Let me please introduce myself / I’m a man of wealth and taste, continuava a canção cada vez mais familiar. Ele sentou-se a meu lado, e num gesto no limite do charmoso, pegou-me delicadamente na mão e simulou o beijo, que embora não tendo existido, (será que não existiu?) teve o condão de me provocar um arrepio que percorreu o braço direito, entrou pelo pescoço e espraiou-se pelo tronco até sair pelo sexo na vibração quase, quase órgásmica. Olhei atónita e confusa para a silhueta em contra luz, que ainda mantinha a minha mão na dele. Senti-lhe os olhos de fogo e tentei descortinar o que haveria dentro deles.
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So if you meet me / Have some courtesy / Have some sympathy, and some taste…, continuava a canção já conhecida, mas não identificada. As congas acentuavam o ritmo e a voz era cada vez mais possessiva, como o olhar que me envolvia e apertava como uma cobra a imobilizar a sua presa. Queria perguntar-lhe o nome, mas não consegui. Em vez disso, vi-te a sorrir. Pensavas em mim e soube isso naquela altura, naquele instante em que senti, ou pensei ouvir uma gargalhada rouca a ecoar bem no fundo de mim mesma. Olhei de novo para o homem que tinha a meu lado, traçara a perna e pusera o braço a contornar-me os ombros nus. Senti um frémito de gozo antecipado e num impulso bem consciente, não posso mentir, desapertei o corpete, botão a botão, e mostrei-lhe os seios sequiosos de luz. Ainda hoje não sei porque o fiz, mas a vontade de abrir o corpete e mostrá-los foi avassaladora.
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Tell me baby, whats my name / Tell me honey, can ya guess my name / Tell me baby, whats my name / I tell you one time, youre to blame / Ooo, Who…., finalizava Mick Jagger. O homem sorriu (será que sorriu?), na minha direcção, levantou-se e pronunciou as únicas palavras de que me lembro, Señorita..., e cruzou a porta do hotel no instante em que entraste. As tuas palavras, quando me viste, assim exposta e meio atordoada, ficaram para sempre gravadas na minha memória, Vinha com uma saudade louca de te beijar os seios... como é que adivinhaste?
Nunca tive a coragem de te dizer. Até hoje!
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(texto publicado no Excitações Primeiro Set)
11 comentários:
Quem bem que me lembro deste post mas confesso que não sei se a memória estaria mais fresca quanto ao texto ou quanto à foto... :)))
Beijinho e Abraço!
Muito bom o texto, sensual Q.B. e com uma foto que é como uma cereja em cima do bolo, simples e divinal.
Bj
É caso para dizer que tens muitas belas histórias no seio dos teus arquivos.... Fizeste bem em voltar, a clientela fiel agradece.
(Fiquei agora curioso sobre a sorte do Comandante Marcos, que será feito dele?)
"...E vi-te entrar na camioneta da escola que partiu numa nuvem de poeira, como nos romances. E eu, a personagem feminina, deveria chorar a ver-te partir..."
Sublime, pois a própria frase evoca em si a consciencia do romance.
É sempre...mas sempre mesmo um prazer ler os teus textos!
Um beijo.
Foi bom reler este texto.
É muito bom ter a Maria Mercedes de volta.
Duas coisas boas para descomprimir deste ambiente depressivo e global que se cola e entranha como o sorrateiro e salgado nevoeiro vindo de Sul pelo Atlântico.
Mas mesmo assim, seria melhor ainda se o primeiro set da ceremony não estivesse arquivado.
E + uma vez...
Obrigado
(pelas palavras deixadas que muito apreciei)
que memórias doces :D
Quem me dera ter uma memória como a tua!!!
A prolongada ausência acabou?
Lamentavelmente não me tem sido possível visitar este blog com tanta assiduidade quanta ele merece e que eu gostaria.
Fica, no entanto, a promessa de um regresso em breve para uma leitura pormenorizada.
Até lá ficam os desejos de tudo de bom e um excelente fim de semana.
Beijinhos e até breve.
;O)
P. S. - Nunca me esqueço de ti!
Voltando para ter o PRAZER de te lêr!...
É bom têr-te de volta... é bom estar de volta! Espero que as férias tenham sido boas!
double exposure! ;)
os teus textos estão sempre recheados de pormenores vintage! Delicia!
beijo*
Que conto tão cheio de TI!
Adorável, pois.
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